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Frangos e salmonela: uma questão de bem-estar animal

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Um dos principais fatores para a contaminação por salmonela se deve aos baixos níveis de bem-estar no sistema de criação de frangos

Você deve se lembrar da devolução de lotes de carne de frango brasileira pelo Reino Unido, devido à contaminação por salmonela. Esse fato reacendeu a preocupação de quanto estamos realmente protegidos de infecções causadas por bactérias contidas em alimentos e ainda remete a um outro assunto urgente: os baixos níveis de bem-estar no sistema de criação de frangos de corte no Brasil.

Os principais problemas na criação de frango no Brasil hoje são a falta de espaço para se moverem adequadamente (galpões fechados e sem a entrada de luz solar) e ambiente pobre. Ou seja, sem enriquecimento ambiental e que não favorece os comportamentos naturais de ciscar, bicar, empoleirar e se esfregar na terra. Soma-se a esse cenário as genéticas de crescimento rápido, em que os animais se desenvolvem de maneira que os ossos não acompanham o aumento muscular, o que provoca dores e graves problemas locomotores.

Estressados, os frangos estão mais predispostos a infecções por bactérias. Um excelente estudo brasileiro de Gomes et al. (2014)¹ associou altas densidades na produção de frango, imunologia e infecção por salmonela. Os autores demonstraram que a capacidade do sistema imunológico em lidar com parasitas depende, em parte, das condições ambientais. Em particular, condições estressantes têm um efeito imunossupressor e podem afetar a resistência a doenças.

Quais os riscos reais da salmonela?

A salmonelose, doença causada pela bactéria salmonela, é a principal causa de gastroenterite humana. A doença frequentemente está associada ao consumo de ovos e de carne de aves contaminados, o que a torna a segunda doença zoonótica (transmissível ao homem por um animal) mais frequente.

Apesar de somente 1% dos tipos de salmonela apresentar risco potencial à saúde humana, a gravidade da infecção depende de fatores como dose infectante, natureza do alimento contaminado ou o estado de saúde da pessoa infectada. De maneira geral, crianças, idosos, imunodeprimidos e pacientes com doenças crônicas são os mais suscetíveis à infecção.

Para prevenir a transmissão da salmonela, a estratégia mais comum é consumir a carne de frango depois de um cozimento a pelo menos 70°C, temperatura capaz de matar a bactéria. Mesmo com esse cuidado, o risco de contaminação cruzada ainda é muito grande - quando a pessoa manuseia qualquer outro alimento com a mesma tábua ou faca utilizadas na carne de frango contaminada.

Antibióticos não são a solução

Para não deixar a doença chegar à população, a forma mais efetiva é combater a contaminação da salmonela no sistema de produção de frangos.

Para isso, os produtores costumam usar antibióticos de maneira preventiva. Essa prática é questionável, pois acaba criando um outro problema: o da disseminação de bactérias multirresistentes, que podem fatais para a saúde humana.

Atualmente, doenças caudas por bactérias resistentes a antibióticos causam a morte de pelo menos 700 mil pessoas por ano no mundo. Em abril de 2019, a ONU (Organização das Nações Unidas) publicou um relatório que alerta o seguinte: se for mantido o cenário atual de uso de antibióticos de maneira preventiva em animais de criação, em 2050, o mundo poderá registrar mais de 10 milhões de mortes devido a doenças causadas por bactérias multirresistentes.

Ainda segundo a ONU, a melhor tática para solucionar o problema é tratar a questão sob a ótica de saúde única, que considera a saúde das pessoas, animais e do meio ambiente.  

Tanto a resistência aos antimicrobianos quanto a contaminação humana por salmonela poderiam ser reduzidas drasticamente se os animais vivessem em melhores condições de bem-estar. É um ganha-ganha, com animais criados com menos sofrimento, o meio ambiente menos contaminado por resíduos de antibióticos, o mercado com ganhos econômicos pela diminuição do descarte de carne contaminada e a população menos exposta a riscos de saúde.

Mude pelos Frangos

A nossa campanha Mude pelos Frangos trabalha para implementar altos níveis de bem-estar na cadeia produtiva dos frangos. Promover ambientes e sistemas de produção que visam o bem-estar animal contribui para reduzir a incidência de contaminação e uso de antibióticos.  

Além disso, sistemas de criação que trabalham com altos níveis de bem-estar são eticamente corretos e promovem um equilíbrio entre o meio ambiente e a saúde de humanos e animais.

Queremos que os consumidores entendam que a demanda excessiva por carne barata é imoral e causa danos a saúde.  A mudança desse padrão só trará benefícios, para os animais, as pessoas e o meio ambiente.

1. A. V. S. Gomes, W. M. Quinteiro-Filho, A. Ribeiro, et al.  Overcrowding stress decreases macrophage activity and increases Salmonela Enteritidis invasion in broiler chickens. Original articles. Pages 82-90, 2014.  https://doi.org/10.1080/03079457.2013.874006