Climate change and factory farming

Pecuária industrial intensiva: a verdadeira culpada pelas mudanças climáticas

Notícias

Os governos devem agir para acabar com a pecuária industrial e, assim, proteger o clima e a natureza, além de salvar bilhões de animais de produção do sofrimento

Com o impacto climático das grandes empresas de carne e laticínios agora superando o de várias nações desenvolvidas1, não há maior ameaça ao futuro de nosso planeta do que a expansão da pecuária industrial.

No setor agropecuário, a criação de animais em sistemas intensivos e em escala quase nunca é apontada como culpada pelas mudanças climáticas. No entanto, é a pecuária industrial que destrói as florestas para dar lugar às plantações destinadas à alimentação animal, liberando carbono na atmosfera. É a pecuária industrial que destrói os habitats da vida selvagem, desloca comunidades locais e lucra com o tratamento cruel de bilhões de animais de criação a cada ano.

Demanda crescente

Combustíveis fósseis são usados para produzir fertilizantes para a ração de animais de produção industrial. Quando aplicados nos campos, esses fertilizantes liberam gases de efeito estufa de óxido nitroso nocivo na atmosfera. Em geral, os gases de efeito estufa da produção e processamento de ração animal de produção industrial representam 45% do total de emissões agrícolas2.

E essa pegada tende a crescer. A demanda por carne está aumentando rapidamente, abrindo caminho para uma expansão ainda maior da pecuária industrial. Em 1970, a produção global de carne bovina era aproximadamente igual às de frango e carne de porco somadas. Com o crescimento da pecuária industrial, espera-se que os animais de criação mais intensiva – frango e suíno – sejam produzidos em níveis três vezes superiores aos de carne bovina até 20503.

Climate Crisis

Isso não significa apenas maior impacto climático, mas também bilhões de novos animais de criação condenados a uma vida de sofrimento. Nas fazendas industriais, os animais são mantidos em espaços apertados (geralmente gaiolas) e mutilados de forma dolorosa. Para lidar com essas condições cruéis e evitar que adoeçam, muitos recebem diariamente uma dosagem de antibióticos em sua ração ou água. Essa é uma prática arriscada, que cria o ambiente ideal para o surgimento de bactérias multirresistentes e sua transmissão para os seres humanos através da cadeia alimentar ou de nosso meio ambiente.

Os animais aglomerados nas fazendas industriais sofrem problemas pulmonares devido aos altos níveis de amônia, e o esterco espalhado nos campos libera mais gases de efeito estufa de óxido nitroso para a atmosfera, além de poluir os cursos de água.

Climate Crisis

É hora de agir

Se os formuladores de políticas quiserem realmente agir sobre o clima na Conferência da ONU sobre Mudança Climática deste ano (COP26), devem mirar a pecuária industrial

As grandes empresas de pecuária industrial continuam controlando nosso sistema alimentar devido a políticas governamentais mal orientadas que confundem pecuária industrial com segurança alimentar.

Entretanto, o grande volume de carne, fornecido a preços baixos pela pecuária industrial, reside em um paradoxo. A segurança alimentar é minada, à medida que a terra é desviada para o cultivo destinado a alimentar animais em vez de humanos. Em 50 anos, a produção de soja cresceu o dobro da taxa de aumento da população humana4.

Atualmente, mais de três quartos (77%) da soja global é fornecida a animais de criação, e não utilizada para alimentação humana. Os agricultores locais se veem envolvidos em um ganancioso comércio global de produtos agrícolas para as fazendas industriais, o que significa que as comunidades locais passam fome.

A pecuária industrial agrava as mudanças climáticas, e os impactos climáticos são sentidos de forma desproporcional pelos pequenos agricultores. O mau tempo faz com que percam suas colheitas ou que seus animais adoeçam. Os animais selvagens padecem mortes agonizantes devido a secas, inundações e incêndios com maior frequência e severidade. Os animais se tornam menos resistentes a doenças e à destruição do habitat devido à expansão da ração animal, aumentando o risco de disseminação de doenças dos animais para os seres humanos. Há um forte risco de que a pecuária intensiva provoque a próxima pandemia5.

As grandes empresas estão fracassando

Climate Crisis

As grandes empresas de pecuária industrial estão se esforçando ao máximo para compensar suas falhas com um rápido aumento do número de compromissos "neutros em carbono". Isso inclui a promessa de reduzir a intensidade de emissões decorrentes de práticas habituais por meio de avanços tecnológicos, como a mudança de formulações de ração para animais6.

Mas pequenos ajustes para reduzir as emissões não serão suficientes, enquanto a produção geral de carne continuar crescendo de forma acentuada. Não há como contornar a natureza intensiva em carbono inerente à pecuária industrial, incluindo sua dependência do comércio global de ração animal.

As empresas também estão comprando o cumprimento de suas obrigações, calculando seus impactos climáticos e pagando para "compensar" os danos através de esquemas que removem carbono da atmosfera, como o plantio de árvores. Isso não é nada mais do que uma lavagem verde (greewahsing)e a ironia é que, com a destinação da terra à produção de alimentos para os animais de produção, resta pouca terra para reflorestar.

É evidente que a pecuária industrial está ganhando, enquanto nosso clima e nossa vida selvagem perdem. As aves de produção representam agora 71% de todas as espécies de aves em massa, enquanto as aves selvagens representam apenas 29% do total de espécies de aves em massa7.

O que os governos podem fazer?

É necessária uma mudança fundamental em nosso sistema alimentar para o bem de nosso clima e de nosso planeta.

Eles devem:

  • Comprometer-se a rejeitar planos para novas fazendas industriais, a fim de limitar sua expansão;
  • Assegurar que as regulamentações governamentais façam com que a pecuária industrial repare seus danos – no clima, no meio ambiente e em nossa saúde;
  • Alterar subsídios e incentivos, a fim de promover um sistema alimentar predominantemente baseado em vegetais e um setor pecuário diversificado com menor número de animais produzidos no total;
  • Atacar grandes monopólios agropecuários, com apoio para garantir o acesso a proteínas nutritivas e acessíveis para todos, inclusive em países de baixa renda.

Se agirmos para eliminar a pecuária industrial agora, podemos fazer uma mudança positiva em nosso clima, proteger habitats preciosos, apoiar comunidades locais e salvar bilhões de animais de uma vida de crueldade e dor.

Referências

1 IATP, GRAIN, 2018, Emissions impossible / How big meat and dairy are heating up the planet, https://www.iatp.org/emissions-impossible 
2 FAO, Key facts and findings, http://www.fao.org/news/story/en/item/197623/icode/ 
3 IATP, GRAIN, 2018, Emissions impossible / How big meat and dairy are heating up the planet, https://www.iatp.org/emissions-impossible
4 Figures taken from Roser et al, Our World in Data / World Population growth, https://ourworldindata.org/world-population-growth#how-has-world-population-growth-changed-over-time. De Maria et al, Trade, Development and Environment Hub, Global soybean trade: the geopolitics of a bean, https://tradehub.earth/wp-content/uploads/2020/10/Global-Soybean-Trade-The-Geopolitcs-of-a-Bean-1.pdf 
5 UNEP, 2020, Preventing the next pandemic: Zoonotic diseases and how to break the chain of transmission, https://www.unep.org/resources/report/preventing-future-zoonotic-disease-outbreaks-protecting-environment-animals-and?_ga=2.124540866.999973992.1633321689-834695897.1630368293 
6 Meda et al, Science Direct, Reducing environmental impacts of feed using multiobjective formulation: What benefits at farm gate for pig and broiler production?, Volume 15, Issue 1, January 2021, https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1751731120300240 
7 Bar-On et al, The biomass distribution on Earth, Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, Volume 115 Issue 25, May 2018. doi: 10.1073/pnas.1711842115.