A bear suffering on a bear bile farm - World Animal Protection

Remédios com partes de animais: vale à pena?

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Se você acha que esse tipo de exploração acontece apenas na Ásia, está enganado.

A chamada medicina popular tem imensa tradição em todo o mundo. Volta e meia ouvimos falar, por exemplo, da incomum composição de remédios da medicina tradicional asiática. Pó de chifre de rinoceronte, pó de escamas de pangolins (um pequeno mamífero que lembra o tatu), bile extraída com muita crueldade de ursos e até partes de grandes felinos, como tigres e a nossa onça-pintada, são alguns dos componentes de origem animal mais conhecidos.

A imensa demanda por esses produtos transformou a medicina tradicional asiática em uma indústria. A procura crescente por partes de animais pela China e países do sudeste asiático, como Vietnã e Tailândia, aliada ao fato de que muitas espécies estão ameaçadas de extinção e à fiscalização mais rigorosa, tem tornado esse mercado muito lucrativo. É a velha lei da oferta e da procura: poucos produtos, quando muito procurados, ficam bastante caros.

Exploração de animais no Brasil

Se você acha que esse tipo de problema não afeta nossos animais, está enganado.

Só para não perder a oportunidade, já que acabamos de citar a onça-pintada, o nosso mais emblemático felino tem sido intensamente caçado para virar uma pasta com supostos efeitos curativos que é enviada para a Ásia. Caçadores têm atuado na Amazônia brasileira e no Suriname e matado grande quantidade desses animais para servir a indústria da medicina tradicional asiática. 

Sucuri-verde passando por uma poça de água

Onças-pintadas são caçadas e mortas para serem exploradas na produção de pastas que acredita-se tratar dores.

Quase a totalidade do animal é fervida até sobrar a pasta usada no tratamento de dores. Além da crueldade envolvida no crime da caça, vale lembrar que as onças-pintadas estão ameaçadas de extinção.

A utilização desses remédios pode até parecer algo estranho e distante para quem mora nas grande cidades. Entretanto, a medicina tradicional ou medicina popular é bastante praticada em várias regiões do Brasil. Com certeza você já ouviu falar de garrafadas e unguentos...

Pois saiba que a medicina popular brasileira utiliza uma infinidade de partes de animais, assim como a medicina tradicional asiática.

Somente na região do rio Negro, no Amazonas, 59 espécies animais têm uso medicinal, sendo 22 de mamíferos, 13 de répteis, 11 de peixes, 8 de aves, 4 de invertebrados e 1 de anfíbio.  A maior parte dos remédios preparados pelas populações ribeirinhas daquela área é para tratar doenças respiratórias como asma, gripe, pneumonia, tuberculose e coqueluche; doenças circulatórias e cardíacas, como acidentes cerebrovasculares, derrames e pressão alta; reumatismo; dores em geral e doenças relacionadas ao útero, como inflamações e recuperação pós-parto. Há também compostos preparados para cicatrizações de machucados.

E você sabe qual é um dos animais mais usados no preparo de remédios?  É a sucuri-verde (Eunectes murinus). A gordura dessa cobra é usada em preparados para cicatrizações, distensões musculares, pneumonias, gripes e por aí vai. Há também medicamentos com partes de jacarés, tartarugas, jabutis, antas, queixadas, onças, veados e capivaras.

Sucuri-verde passando por uma poça de água

Sucuris são animais silvestres, não produtos.

Pênis de anta, por exemplo, é desidratado e guardado por um longo tempo para ser usado no preparo de chás para tratamento de inflamações, hemorragias pós-parto e problemas uterinos.

No Nordeste também encontramos inúmeras receitas de remédios com animais selvagens. Em um povoado da Chapada Diamantina, na Bahia, por exemplo, partes de animais de 52 espécies são usadas para prevenção ou tratamento de 39 enfermidades. Testículo de saruê (um marsupial) é usado para apressar o parto. Já o pênis do quati atua contra impotência, da mesma forma como a genitália do boto é usada na Amazônia brasileira.

Você acredita que até em botecos é possível achar partes de animais em bebidas que prometem alguma cura, melhoria no organismo ou ser afrodisíaca? É cachaça com escorpião, com aranha-caranguejeira, com diversas cobras e lagartos. Além do crime ambiental e da crueldade, há um enorme risco para a saúde de quem toma essas bebidas.

Se entrarmos no universo das crendices, o uso de animais ou suas partes como amuletos ganha uma dimensão imensa no Brasil. Olho de lobo-guará e dente de jacaré trazem sorte ou afastam o chamado “mau-olhado”. Jabuti deixado sob a cama de quem tem problemas respiratórios, como asma e bronquite, ajuda na cura do problema. Tem tanta coisa...

Seja no Brasil ou na Ásia, não existe comprovação científica para esses medicamentos. Ou seja, animais podem estar sendo cruelmente caçados e mortos por nada. Ainda há o risco de que as doenças das pessoas piorem ou que esses remédios façam mal para quem os utilizou.