Turismo com elefantes na Tailândia explora animais e pessoas, diz estudo
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Realizamos a primeira pesquisa sobre a situação socioeconômica dos mahouts na Tailândia e descobrimos que, assim como os elefantes, eles também são explorados
“Mahout é um montador, domador, ou cuidador de elefantes. Geralmente, os mahouts ingressam na profissão da família ainda novos, quando lhes é dado um elefante filhote. Um mahout permanece ligado ao seu elefante pelo resto de sua vida”.
Essa é a definição do Wikipédia para designar os mahouts e ela dialoga diretamente com a visão romantizada que muitos turistas têm sobre a relação dos mahouts com seus elefantes. Mas, infelizmente, a realidade na indústria turística da Tailândia é muito diferente.
Nossa nova pesquisa, realizada com o Departamento de Sociologia e Antropologia da Universidade de Chiang Mai, na Tailândia, mostra que essa visão idealizada dos mahouts está muito longe da verdade.
Tradição subvertida em objeto turístico
Com a crescente demanda por atrações turísticas com elefantes, cada vez mais o papel tradicional dos mahouts é assumido por trabalhadores comuns, sem habilidade e nem treinamento suficiente para isso.
A realidade é que muitos desses empregados, denominados “mahouts”, aceitam essa função por não conseguirem encontrar um emprego alternativo ou acreditam que será um trabalho fácil.
Longe de serem “ligados um ao outro por toda vida”, muitos elefantes explorados pela indústria do entretenimento acabam tendo 4 ou mais mahouts antes de morrerem.
É importante lembrar que isso não significa que os mahouts, no sentido tradicional, sejam uma farsa – há, de fato, mahouts verdadeiros e pude testemunhar isso nas minhas recentes viagens à Tailândia, mas esses são a exceção, não a regra.
A maior parte das nossas pesquisas sobre o turismo com elefantes na Tailândia se concentra nas condições de vida inaceitáveis que os elefantes são obrigados a enfrentar para entreter turistas.
Porém, através do nosso trabalho em campo, descobrimos que a questão dos mahouts também pode ser bem sombria. Agora precisamos questionar as duas formas de exploração: dos mahouts e dos elefantes.
Elefantes, mahouts e turistas em risco
Enquanto os elefantes sofrem com más condições de vida, sendo obrigados a carregar pessoas nas costas e se apresentar para turistas, os mahouts vivem com pouca segurança financeira, recebendo salários extremamente baixos para um trabalho tão arriscado – muitos são feridos no exercício de suas atividades.
A falta de preparação técnica coloca em sérios riscos tanto os mahouts, quanto os turistas que interagem com os elefantes sob a supervisão deles.
Assim como as preocupações com o bem-estar animal, o risco de ferir pessoas é algo que a indústria do turismo deveria levar muito a sério.
Pelos mahouts e pelos elefantes: está na hora de mudar o modelo de turismo praticado na Tailândia
Os mahouts desempenham um papel muito importante para o bem-estar dos elefantes em cativeiro e são fundamentais para o nosso trabalho em transformar os campos de elefantes em santuários, lugares seguros para esses magníficos animais.
Nossa pesquisa mostrou que, atualmente, 65% dos mahouts usam objetos de tortura (como ganchos ou varas afiadas) para controlar seus elefantes nas atrações em que são montados ou interagem diretamente com turistas.
Em santuários, não há necessidade do uso dessas ferramentas. Isso acontece porque, sem a interação direta com turistas, os elefantes não ficam estressados e não precisam ser controlados.
Ao contrário das atrações cruéis, atividades de observação de elefantes livres – que são menos invasivas e agressivas – oferecem benefícios significativos tanto para os animais, quanto para os mahouts. Ao invés de exercer domínio sobre os elefantes, os mahouts cuidariam deles.
Essa dinâmica faz, inclusive, com que os proprietários dos campos de elefantes valorizem mais o trabalho dessas pessoas e o bem-estar dos animais.
Bons exemplos para seguir
Já vimos nossa proposta dar certo em locais na Tailândia que estão se adequando às boas práticas com elefantes, como no caso do Happy Elephant Care Valley, do Mahouts Elephant Foundation (MEF) e o Boon Lott Elephant Sanctuary (BLES).
Nosso relatório “Taken for a ride” , mostrou que lugares como estes estão dando grandes passos em favor dos elefantes em cativeiro.
Um dos bons exemplos que podemos citar são as atividades em que os turistas podem caminhar silenciosamente pelos campos atrás do grupo de elefantes, sob orientação e olhar atento dos mahouts. É uma atividade onde todos se respeitam.
Um elefante só pode ser completamente feliz e livre se estiver na natureza, porém, para melhorar a vida dos 3.000 elefantes que atualmente vivem em cativeiro para o turismo na Ásia, precisamos incentivar que esses locais sejam cada vez mais éticos com os animais, ao invés de continuarem sendo cruéis.
E a melhor forma de começar a mudar essa situação é acabando com o contato direto dos turistas com os elefantes. Essencialmente, os animais estarão muito mais felizes e seguros à distância.
Como você pode ajudar
Interagir com animais silvestres em atrações turísticas pode parecer inofensivo, mas não é. Se você puder montar, tocar, abraçar, alimentar ou tirar selfies com algum animal silvestre, é muito provável que ele esteja enfrentando uma vida cruel de intenso sofrimento.
Muitos turistas fazem esse tipo de atividade porque amam os animais, mas se conhecessem a realidade sombria por trás delas, jamais aceitariam financiar essa indústria.
Neste Dia Mundial do Elefante, vamos fazer a coisa certa pelos elefantes e mahouts. Compartilhe essa história e incentive mais pessoas a praticarem um turismo responsável com os animais e a comunidade local.
A indústria do turismo devia levar mais a sério o bem-estar animal e a segurança das pessoas